Pessoal hoje será um texto enviando por uma colaboradora muito especial que estuda e pesquisa na área da neurociência. No final eu a apresento. Leiam que o texto está simplesmente incrível!
Imagine que você está em casa e
resolve comprar pão francês para o café da manhã, como faz rotineiramente. Chegando
ao mercado, apesar do esforço, não se recorda muito bem, “O que era pra comprar
mesmo?”. Liga pra casa e seu familiar te responde sobre os pães. Pede os pães,
paga e sai do mercado. “E agora, como era o caminho? Direita ou esquerda?”.
Imagine ir perdendo sua memória aos poucos, lenta e dolorosamente, não se
lembrando mais do que falou ou perguntou a alguns minutos, se comeu, se tomou
banho, com alguns raros momentos de lucidez. Bem vindo à vida do paciente com
Alzheimer.
Segundo Carlos Moreno, ator, no
prefácio do livro Ausência: “Para o doente, a perda gradual da memória é o
apagar do mais essencial que possuímos, do que nos define e nos diferencia
daquilo que faz cada um de nós, humanos: nossa identidade. Para o familiar, é a
dor de um luto prolongado, pois, embora esteja vivo, aquele à nossa frente vai,
pouco a pouco, deixando de ser quem um dia conhecemos e amamos.”.
Cena do filme Para Sempre Alice (2014)
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Por esse, e por tantos outros motivos,
resolvi estudar a Doença de Alzheimer.
A Doença de Alzheimer (DA) é uma
doença neurodegenerativa que afeta grande parte da população idosa mundial. Ela
é marcada pela perda de memória recente, e, com o seu avanço, vai levando a um
intenso declínio cognitivo. Além disso, o paciente também pode apresentar
sintomas tais como agitação, hiperatividade, ansiedade, perda de peso,
depressão, distúrbios no ciclo circadiano e no sono, podendo inclusive levar a
morte.
Ela pode ser dividida em dois tipos:
a genética, que acomete uma pequena parcela da população (menos de 5% dos casos,
sendo sua incidência em adultos mais jovens – até uns 60 anos), e, como seu
nome já indica, a causa é puramente genética; é a doença que vemos representada
no filme “Para Sempre Alice” – que, aliás, recomendo fortemente -, e a
esporádica, mais comum (cerca de 95% dos casos), multifatorial, porém com causa
ainda desconhecida.
Em ambos
os casos, apresenta dois marcadores histopatológicos no sistema nervoso central:
as placas extracelulares do peptídeo beta-amilóide e os emaranhados
neurofibrilares da proteína Tau hiperfosforilada (intracelular). A proteína Tau
se liga ao microtúbulo, promovendo sua estabilização, que, por sua vez, compõe
o citoesqueleto do neurônio. No Alzheimer, ocorre o processo de fosforilação da
Tau, acabando por degradar o microtúbulo, não permitindo o transporte de substâncias
entre um neurônio e outro e impedindo a comunicação entre eles, levando a morte
celular.
Ilustração do que ocorre no microtúbulo devido a Tau em um neurônio normal versus um neurônio acometido pelo Alzheimer. |
A vida no laboratório
Assim que decidi que queria trabalhar
com pesquisa a respeito do Alzheimer, comecei a procurar, dentro da
Universidade, quais professores tinham sua linha de pesquisa voltada para essa
área. Assim, não foi difícil encontrar meu atual orientador e, após algumas
reuniões, comecei, em 2015, a fazer parte do Laboratório de Morfofisiologia.
O começo é sempre um período de
adaptação, no qual você conhece e experimenta a rotina do laboratório e decide,
com a ajuda do seu professor, qual será o tema do seu trabalho, dentro de todas
as possibilidades em que ele trabalha. No meu caso, tinha duas possibilidades:
trabalhar com células ou com animais. Então, após certo tempo convivendo lá
dentro, meu professor teve uma ideia de um determinado tema, seguindo a linha
de pesquisa em que ele trabalha. Assim, depois de escrevermos o projeto e de
muuuuito treino, finalmente, em abril de 2016, dei início ao projeto: “Efeito
da temperatura em modelo animal para a Doença de Alzheimer esporádica”.
Sim, você não leu errado. Minha
pesquisa é com animais. Por um lado, isso é incrível, pois os animais conseguem
mimetizar os sintomas da Doença e nos fazem entender pelo menos um pouco de
como o Alzheimer afeta o cérebro das pessoas e como o organismo vai reagindo a
doença. Por outro lado, trabalhar com animais gera um desconforto a muitas
pessoas, mas tenha em mente que todos os experimentos passam pela aprovação de
um comitê de ética e existe uma série de medidas que regem o uso de animais em
laboratório.
Nem sempre sua rotina científica será
um mar de flores. Os experimentos podem não dar certo, os equipamentos não
funcionarem adequadamente bem no dia que você iria usar e os animais resolvem
não colaborar durante o teste. Mas, quando você começa a analisar seus dados,
vê que eles estão se transformando em resultado, e que podem te levar a algo interessante,
isso não tem preço! É uma felicidade que não tem tamanho e, só a vida acadêmica
pode te proporcionar!
Então, por mais difícil e complicada que essa caminhada pareça e, se a ciência e a pesquisa estão nos seus objetivos de vida, não desista do seu sonho! Pense que, com o seu trabalho você pode levar informação a tantas pessoas e ajudar muitas outras. Que você nunca perca as motivações para continuar e que tenha muito sucesso na carreira em que decidir!
Apresentação Colaboradora
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Talita Senra
Estudante do Bacharelado em Ciência & Tecnologia e Neurociência Universidade Federal do ABC (UFABC) Contato: talita_tmsm@hotmail.com |
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Referência Bibliográfica e links interessantes:
[1] http://www.nytimes.com/2006/10/24/health/24alzh.html?_r=3& // História do William Utermohlen
- Filme: Para Sempre Alice (2014)
- Livro: Ausência. Flavia Cristina Simonelli. Novo Século Editora.
- Artigos:
Carrettiero, D. C., Santiago, F. E., Motzko-Soares, A. C. P., & Almeida, M. C. (2015). Temperature and toxic Tau in Alzheimer's disease: new insights. Temperature, 2(4), 491-498.
de Paula, C. A. D., Santiago, F. E., de Oliveira, A. S. A., Oliveira, F. A., Almeida, M. C., & Carrettiero, D. C. (2016). The co-chaperone BAG2 mediates cold-induced accumulation of phosphorylated tau in SH-SY5Y Cells. Cellular and molecular neurobiology, 36(4), 593-602.
[1] http://www.nytimes.com/2006/10/24/health/24alzh.html?_r=3& // História do William Utermohlen
- Filme: Para Sempre Alice (2014)
- Livro: Ausência. Flavia Cristina Simonelli. Novo Século Editora.
- Artigos:
Carrettiero, D. C., Santiago, F. E., Motzko-Soares, A. C. P., & Almeida, M. C. (2015). Temperature and toxic Tau in Alzheimer's disease: new insights. Temperature, 2(4), 491-498.
de Paula, C. A. D., Santiago, F. E., de Oliveira, A. S. A., Oliveira, F. A., Almeida, M. C., & Carrettiero, D. C. (2016). The co-chaperone BAG2 mediates cold-induced accumulation of phosphorylated tau in SH-SY5Y Cells. Cellular and molecular neurobiology, 36(4), 593-602.
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